11 outubro 2010

'Hamlet' se perde no palco/tarefas:

Estranho, eu não sou Hamlet (em processo)
Encontro processos criativos em artes cênicas e audiovisual/nace/ufal
espaço cultural linda mascarenhas
07 de  outubro de 201

- antes do inicio:
o performer aparece pela porta do teatro, cumprimenta as pessoas, avisa que ainda não é o começo; agradece aos organizadores do evento o convite e ao patrocínio exclusivo da própria mãe para compra dos materiais a serem usados na ação. Solicita que todos façam juntos uma grande respiração para equalizar um pouco a energia entre eles. Mostra o seu celular perguntando aos presentes 'que objeto é este?'. A medida que as respostas surgem, o performer faz com que elas sejam cada vez mais detalhadas e, por fim, explica que fez isso apenas para checar se todos estão vendo as mesmas coisa. Agradece a presença, pede que fiquem a vontade que ele ta saindo e quando aparecer na janela, começa a performance. sai.
Do lado de fora, se alonga mais um pouco e faz exercícios de respiração. corre até o portão de entrada, anda até a calçada, olha os carros passando na grande avenida. corre para a janela de vidro.

- agir ou não agir:

pela janela, o performer observa os presentes. vai até a porta, abre. Olha bem o limite entre o dentro e fora do espaço. Retira de sua mochila os livros: 'Café com queijo, corpos em criação' (Renato Ferracini); 'Teatro laboratório de Jerzy Grotowski 1959-1969 (Jerzey Grotowski e Ludwik Flaszen)'; 'A arte da performance; do futurismo ao presente' (RoseLee Goldberg) e 'Hamlet' (Willian Sheaspekeare). Joga um livro por vez no chão, pisando em cima deles, passo a passo para entrar no espaço. o último livro é Hamlet. Performer suspende a ação; mantendo-se equilibrado apenas por um pé em cima do livro; olha os presentes. Pega o celular e grava as informações sobre o dia-hora-local e sobre como ele olha o olhar das pessoas. Desce do livro, coloca em cima da mesa de estudos* e entrega pedaços de papeis em branco para algumas pessoas, ao acaso dos olhares. Rasga pedaços do pedaço de papel e joga no chão, formando uma trilha até a porta do teatro. Esta ação é executada com a ajuda de um dos presentes.

* na mesa de estudos estão dispostos o computador do performer (conectado a um mini projetor) e o projeto de doutorado do performer submetido a uma agência de financiamento de pesquisa. Na parede próxima a mesa projeta-se um vídeo com imagens do performer e da atriz Antígoni Spanou chorando. Ao lado da projeção um aviso: pesquisador ainda sem bolsa, deixar sua doação. Do lado do aviso, um saco branco.

- não quero mais morrer, não quero mais matar:

No meio fundo do palco, o performer explica as instruções da ação através de folhas de papeis retiradas de sua roupa, onde se lê. 

BOA NOITE!
PRECISO DA AJUDA DE VOCÊS PARA REALIZAR ESTA AÇÃO
PARA CADA CORAÇÃO ATIRADO EM MIM FAZENDO-ME SENTIR DOR
ENTREGAREI UMA PEÇA DE MINHA ROUPA
OBS: AS ROUPAS PRECISAM SER DEVOLVIDAS NO FINAL
TA VALENDO

Esta parte da ação é uma apropriação/atualização/recriação feita da obra Mel-o-drama II da peformer paulista Thaíse Nardin. Veja informações da performance aqui

- Ophélia chamando:

no meio da ação, o celular do performer toca. É a atriz previamente contactada (Antígoni Spanou), se dizendo Ophélia. O performer entrega seu celular para um dos presentes e mantém diálogo através dele com a atriz/Ophélia. É um dialogo que se nega - atriz dizendo que é ophélia e que quer falar com Hamlet e o performer dizendo que não é Hamlet, que está ocupado e que não pode falar com ela naquele momento. Ophélia fala em português, inglês e grego e usa também fragmentos do texto de Heiner Muller. Enfim diz que vai se matar. O performer pede o celular de volta e tenta falar com a atriz/Ophélia. Ela encerra a ligação. O performer coloca para todos ouvirem em seu celular um fragmento do texto de Heiner Muller (Máquina Hamlet) gravado por ele no dia anterior:

Não quero mais comer beber amar uma mulher um homem uma criança um animal. Não quero mais morrer. Não quero mais matar.
Arrombo a minha carne lacrada. Quero habitar nas minhas veias, na medula de meus ossos, no labirinto de meu crânio. Retiro-me para minha víceras. Sento-me na minha merda, no meu sangue. N’algum lugar são rompidos ventres para que eu possa morar na minha merda. N’algum lugar ventres são abertos para que eu possa estar sozinho com meu sangue. Meus pensamentos são chagas em meu cérebro. O meu cérebro é uma cicatriz. Quero ser uma máquina. Braços para agarrar pernas andar nenhuma dor nenhum pensamento.


O áudio fica tocando até o final da ação, repetida vezes.

- Queres comer meu coração?:

Quando o performer ja está praticamente sem roupa, usando apenas uma peça íntima feminina, cor da pele e com um buraco na região do sexo, mostrando seu pênis todo enrolado numa lã vermelha; sobe ao palco outra performer previamente contactada (Charlene Asaad). Atira o coração 3 vezes no performer. Os dois de afastam e num impulso caminham em direção um do outro. O performer retira o vestido da performer e o veste. Vai até os corações, coloca a máscara dos olhos e diz:

quando tinha quatro de idade antonio fugiu de casa pela primeira vez
ele estava brincando com um amigo, também chamado antonio no quintal da casa de sua avó.
os dois antonios saíram em busca de pedras que os ajudariam a construir as muralhas de seu castelo de infância.
passaram oito horas perdidos num terreno baldio.
e antonio sabia que para encontrar de volta o quintal da casa de sua avó teria que primeiro se encontrar o mar.

O performer retira a máscara dos olhos e diz:

hoje quando penso o que eu sou enquanto artista
eu encontro antonio
perdido entre o quintal e o mar de sua infância

O performer se levanta, re-coloca a máscara dos olhos e começa a girar sob o próprio eixo. Enquanto isso, a performer recolhe as roupas do performer com os presentes e começa a vesti-las no palco. O performer pede muito suavemente a ajuda dos presentes para achar a saída; fazendo todos saírem do espaço bem próximos, num bolo-humano, 'bem juntinho, bem perto um do outro'.
Enquanto o performer sai com as pessoas; no palco, a performer (vestida com toda a roupa do performer) lê o seguinte fragmento do texto de Muller:

Eu não sou Hamlet. Não represento mais nenhum papel. Minhas palavras já não me dizem mais nada. Os meus pensamentos sugam o sangue das imagens. Meu drama não se realiza mais. Atrás de mim monta-se a cena. Por pessoas às quais meu drama não interessa, para pessoas às quais ele nada importa. A mim ele também já não interessa. Não entro mais. A montagem cênica é um monumento. Representa em grandiloqüência cêntupla, o homem que fez história. A petrificação da esperança. Seu nome é insubstituível. A esperança não se concretizou. O monumento jaz no chão, demolido três anos após o funeral oficial, daquele que foi odiado e reverenciado por seus sucessores no poder. A pedra é habitada. Nos espaçosos orifícios do nariz e das orelhas, nas dobras da pele e do uniforme da demolida estátua, anicha-se a população de miseráveis da cidade. À derrubada do monumento segue-se, depois de um tempo apropriado, a rebelião. O meu drama, se ainda tivesse lugar, realizar-se-ia na época da revolta. A rebelião começa como um passeio. Contra as normas de trânsito no horário do almoço. A rua é dos pedestres. O meu lugar,caso o meu drama se tivesse realizado, seria dos dois lados da frente, entre as frentes, acima delas. Encontro-me no cheiro de suor da multidão e jogo pedras em policiais, soldados, tanques, vidros à prova de bala. Espio pela porta de vidro blindado aglomerada que se aproxima e cheiro o meu suor frio. Sufocado pela ânsia do vômito, agito o meu punho contra mim mesmo, eu que estou detrás do vidro blindado. Agitado pelo medo e pelo desprezo, vejo-me na multidão que se aproxima, minha boca espumando, agitando o meu punho contra mim mesmo. Penduro pelos pés a minha carne uniformizada. Sou o soldado na torre blindada, minha cabeça está vazia debaixo do elmo, o grito sufocado sob as correntes. Sou a máquina de escrever. Apronto o laço quando os líderes forem enforcados, puxo o banquinho de apoio, quebro o meu pescoço. Sou o meu prisioneiro. Alimento com meus dados o computador. Sou o banco de dados. Sangrando na multidão. Respirando aliviado atrás da porta de dois batentes.Segregando escarro verbal no meu balão impermeável aos ecos sobre a batalha. O meu drama não teve lugar. O texto perdeu-se. Os atores penduraram seus rostos nos ganchos do vestiário. O ponto apodrece na sua caixa. Na platéia, os cadáveres de doentes de peste empalhados não mexem mão alguma. Vou pra casa e mato o tempo, de acordo / com meu indiviso ego.
Na solidão dos aeroportos Eu respiro aliviado. Eu sou Um privilegiado. O meu nojo É um privilégio. Protegidos por muralhas. Arame farpado, prisão. Não quero mais comer beber amar uma mulher um homem uma criança um animal. Não quero mais morrer. Não quero mais matar.
Arrombo a minha carne lacrada. Quero habitar nas minhas veias, na medula de meus ossos, no labirinto de meu crânio. Retiro-me para minha víceras. Sento-me na minha merda, no meu sangue. N’algum lugar são rompidos ventres para que eu possa morar na minha merda. N’algum lugar ventres são abertos para que eu possa estar sozinho com meu sangue. Meus pensamentos são chagas em meu cérebro. O meu cérebro é uma cicatriz. Quero ser uma máquina. Braços para agarrar pernas andar nenhuma dor nenhum pensamento.


- A vida, às vezes, volta:

Já na calçada, o perfomer pede para as pessoas o deixarem próxima ao muro. O performer encosta a cabeça no muro, depois larga-se na calçada. Retira um baton vermelho, pinta as unhas dos pés-mãos e o rosto. joga o baton fora. Pega um espelho velho e começa a mostrar o espelho para as pessoas.

2 comentários:

Jorge/cia.ltda. disse...

CLARO QUE EU NÃO CONSEGUI LER TUDO
Mas acho o máximo você escrever tudo isso. Juro!

?estranho! disse...

nem é tanta coisa assim pra ler rs eu gostaria de ter feito este tipo de escrita em todas as performances que fiz. mas aos poucos vou fazer nas antigas.