14 abril 2008

Estranho pelo outro -Jorge Shutze

ESTRANHO, UM CARA COMUM

Performance – FLÁVIO RABELO

DIA 04.05.2005

LOCAL – defronte a Catedral Metrolpolitana de Maceió.

... não encontro resposta, sou. É isto apenas o que me vem da vida. Mas sou o quê? A resposta é apenas sou o quê. Embora às vezes grite: não quero mais ser eu!!. Mas eu me grudo a mim e inextrincavelmente forma-se uma tessitura de vida.

(LISPECTOR, Clarisse -1980)

Quem somos, o quê?

Será que somos mesmo o que supomos ser? Ou antes, será que somos somente o que supomos ser?, ou, além do que supomos somos mais, um outro, que nos é sem que o saibamos?

Questões que estão na base da arte do ator, e do teatro enquanto conhecimento humano.

A palavra ator tem um significado direto: o que é um outro, para além de si, e deriva do êxtase (ekstase) provocado pelo culto ao deus Dionísio, que é o Deus do lúdico, mas também do êxtase, da desmedida humana, na verdade um convite ao espírito, à fuga do patrão psico-social pessoal. (BRANDÃO, Junito de Souza – 1996)

Daí falar da experiência performática que antes de querer incutir ou “ensinar” uma mensagem ou enredo e discutir suas moralidades, trata-se antes, na maioria dos casos, de colocar o corpo e o ser numa experiência que na maioria das vezes é pública (embora nem sempre), e que quando assim o é, convida o mundo das realidades humanas a apreciá-la, tomar parte nela, de alguma forma, isso quando o fato público não é inclusive parte da experiência a ser vivida (GLUSBERG, Jorge – 1987), para talvez com isso ampliar a perspectiva do que se é.

A performance, que preferimos chamar de ação (na perspectiva de Joseph Beyus), de Flavio Rabello, realizada no dia 04 de maio, defronte a igreja Matriz nos coloca diante desse espanto: por 12 horas, trajando um figurino e maquiagem que se indefinível, escondia um pouco suas próprias característica, jogado no chão, segurando um espelho que era apontado aos transeuntes, e um livro, que as vezes lia.

Podemos mesmo forçar nosso ser a uma maior perpectiva de nós mesmos? – torna a questão.

A ação causava indignação , indiferença, enfim todo aquele rol de reações e não reações que o estranho pode provocar, mas pelo menos áqueles que tinham consciência de toda a “peripécia” artística envolvida no evento, como nós, a ação além do espanto causava uma ponta de inveja: se não por não saber o que somos; se não sabendo, nunca haver tentado não ser o que não sabemos ser; se por não sabermos também o que fazer do que somos e do que não somos; enfim por sabermos ali que nossa ação é o único meio disponível para podermos se não entender pelo menos experienciar o que profundamente somos, através da possibilidade de ousarmos em pouco do que não somos.

Aprendi que cada um de nós é todos os outros, que minha solidão não fora real e que o ator, melhor do que qualquer pessoa pode compreender os homens por compreender a si mesmo. Aprendendo a interpretar aprendi também, de certa maneira, a admitir que os outros são nós mesmos, que nós mesmos somos os outros, e que toda solidão se identifica.

IONESCO, Eugénè

JORGE SCHUTZE –

Bailarino, ator, coreógrafo

Graduado em Artes Cênicas - licenciatura

Bilbliografia

BRANDÃO, Junito se Souza – O Teatro Grego – Comédia e Tragédia.

Ed. Vozes. 1996

ESSLIN, Martin – O Teatro do Absurdo. Zahar Editora. 1968

GLUSBERG, Jorge – A Arte da Performance – Ed. Perspectiva. 1987

LISPECTOR. Clarisse – Água Viva. Ed. Nova Fronteira. 1980

Sites

www.art.com- RODRIGUES, Jacinto – Joseph Beys – O Xamã da Arte Contemporânea. .12.07.2004

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