02 maio 2008

FORA DO EIXO

Umas das ações desta pesquisa, a intervenção O que há no papel em branco... fará parte da programação do Fora do Eixo, evento que "reunirá criadores que se dedicam a uma pesquisa de linguagem experimental voltada para questões pertinentes à relação entre arte e sociedade, formação estética e questionamentos sobre a relação mercadológica da arte" .O evento contará com participação de artistas de todo o país e acontecerá em Brasília , dos dias 18 a 25 de maio.
Como a minha viagem para continuação do processo do Hotel Medea em Londres foi antecipada para esta semana, não poderei ir ao Fora do Eixo. Mas a intervenção continua na programação e será executada coletivamente por outros artistas presentes. Eu não vou, mas a ação vai. Uma sugestão ótima feita pela galera da organização e que muito me interessa por várias razões.
As possibilidades de novas aberturas na estrutura da intervenção e a rede de relações da pesquisa se ampliam em várias camadas. Tenho trabalhado muito com a apropriação e troca de ações de outros artistas; este é um dos aspectos mais determinantes neste processo de criação do Corpo Estranho. Abaixo, segue o texto que encaminhei para a produção repassar aos artistas.


Sobre a intervenção O que há no papel em branco:

Esta intervenção faz parte de meu processo de pesquisa de mestrado[i], dentro do que chamo: estudo sobre ações estranhas, que consiste em ‘retirar’ do cotidiano algumas ações, preferencialmente as que indiquem condicionamentos corporais; acrescentando algum elemento subversivo ou invertendo algum aspecto de sua execução a fim de criar uma rede, ou um jogo, de possíveis re-significações e estranhamentos nas relações entre os envolvidos no acontecimento. Ela surgiu a partir da necessidade de reflexão sobre:

  • O próprio conceito de ‘ação’, no sentido de ‘algo’ realizado gerador de uma transformação;
  • A capacidade de jogo e presença na relação com o espaço e os corpos.

Fui inspirado também no pensar é esculpir de Joseph Beuys.

O ato de entregar os papéis em branco pode ser preenchido com diversos estados internos que pode re-significar a sua execução; e esta re-significação se dá no momento de sua execução, sem muita pré-elaboração, a partir da dinâmica interna da própria ação e suas variáveis de ritmos e fluxos.

Para mim, nos dias que executo esta ação o silêncio é importante, procuro falar o mínimo possível. Mas não é um silêncio imposto, é uma opção, é interno, próximo ao silêncio buscado em exercícios de meditação.

A ação, ou jogo, de entregar papéis em branco surgiu dentro de um workshop intensivo de treinamento para atores/performers chamado Drift Project, em dezembro de 2006, mas tem uma história ‘pregressa’ relacionada ao espetáculo Pega Ladrão, dos Saudáveis Subversivos, com direção do Glauber Xavier, onde trabalhei como ator pesquisando o universo dos vagabundos, fracassados e marginais de nossa sociedade. Eu já realizei esta intervenção sozinho e coletivamente e, claro, há muita diferença entre estas formas de realização. Utilizo-a dentro do meu solo Estranho, eu não sou Hamlet, que também faz parte do mestrado. Esta será a primeira vez que ela será realizada coletivamente sem minha presença. Gosto muito desta proposta e agradeço aqui mais uma vez ao pessoal do FORA DO EIXO por ter me feito a sugestão, já que não posso está aí por questões de trabalho e pesquisa.

Espero que a execução seja prazerosa para todos e sintam-se a vontade para subverter qualquer indicação minha por necessidade dos seus próprios interesses artísticos. Se possível, entrem em contato: flaurabelo@gmail.com.

Valeu.


Taks (tarefas) -
A estrutura da intervenção é simples:

  1. Sair para andar sozinho e em silêncio por quinze minutos, meia hora antes de começar a intervenção. Deixar se levar neste caminhar seguindo os fluxos coletivos e as reações ‘espontâneas’. Eu nunca confiro a passagem do tempo em relógios, assim esses ‘quinze minutos’ são subjetivos.
    1. Foco na respiração e na relação com o espaço e as pessoas.
    2. Atenção aos cheiros e sons, os mais sutis e distantes.
    3. Atenção aos detalhes – observar as pequenas coisas ao seu redor.
    4. Abrir os poros, ampliar os espaços vazios do corpo.
  2. Ficar cinco minutos parado em algum lugar, como numa ‘pausa viva’, numa suspensão.
  3. Voltar ao local marcado para realização da ação.
  4. Iniciar o jogo de entrega dos papeis com as pessoas que passam pelo local.
  5. Na ação, eu falo o mínimo possível, mas não vejo isto como regra.
    1. Jogar a possibilidade não entregar o papel, com o ‘oferecer o papel’, as variações rítmicas, os deslocamentos pelo espaço, as pausas.
  6. Quando acabar os papeis, continuar a ação por mais um tempo.
  7. Refazer o mesmo percurso da caminhada inicial.
  8. Ficar novamente em ‘pausa viva’, suspenso, agora o tempo que quiser...
  9. Tudo realizado nos paradoxos: visível e invisível, comum e estranho, cotidiano e artístico.



[i] Título: Corpo Estranho - corpo performático multirelacional – dialéticas dos processos de construção. Orientação de Renato Ferracini e co-orientação de Fernando Villar.

Nenhum comentário: